O Perigo de Ter Sempre Certeza
- Wagner Borba
- Jan 2, 2024
- 4 min read
A maioria de nós, seres humanos, costuma sempre contextualizar as ideias para que as pessoas confiem em nós. A necessidade de estima, não à toa, está presente na famosa pirâmide de Maslow e mostrar confiança naquilo que falamos passa para os demais a impressão de que estamos seguros com aquilo que é apresentado. Queremos que nos amem, que confiem em nós e, para que isso aconteça, trazemos afirmativas até mesmo em coisas que não são tangíveis, acreditando que isso nos dá credibilidade.
Trabalhando com gestão de entregas há mais de 10 anos não há frase que eu mais tenha ouvido do que a clássica "quando fica pronto?". E, apesar de ser uma frase que inevitavelmente nos coloca no centro de um paradigma, a resposta não necessariamente reflete um padrão. Sempre quando precisei responder a esta pergunta meu questionamento foi: com que nível de certeza você espera que eu responda?
Essa resposta pode parecer um tanto pretensiosa ou até mesmo malcriada, mas talvez seja a mais sensata e a que mais respeite à matemática. E o que a matemática tem a ver com ter ou não certeza de alguma coisa? Tudo! As pessoas esperam respostas exatas para abstrações futuras e isso é extremamente perigoso quando o que está em jogo são as expectativas das pessoas. Essas nem sempre aceitam respostas em que o nível de confiança não beire os 100%.

Nada que funcione em um "momento futuro" pode ser deixado de fora do campo probabilístico (anota isso).
Como gestor lidamos com muitas expectativas diferentes sobre a mesma coisa, além disso temos a jornada dos nossos liderados, o desafio de mantermos engajados os stakeholders, atender as necessidades dos clientes e do mercado e por ai vai. Porém a coisa mais valiosa que aprendi em todos esses anos (acertando e errando) é que em um processo de entrega, seja de um produto, resultado ou serviço, nós nunca podemos dizer que temos 100% de certeza (a famosa 'certeza absoluta') em relação a alguma coisa. Isso serve tanto para transmitirmos uma mensagem positiva quanto para uma negativa, visto que também não é prudente afirmar com 100% de confiança que algo não pode acontecer.
Certa vez, atuando em um projeto de infraestrutura de telecomunicações, tínhamos o desafio de subirmos com uma antena com quase de 4m de diâmetro em uma montanha com uma estação em seu topo. O caminhão não pôde subir porque estava chovendo, o barro estava molhado e o caminhão deslizava para baixo. Chegamos a tentar mitigar alugando um trator, que também não conseguiu subir com a antena. O meu diretor me ligou desesperado perguntando se não tínhamos outra forma de resolver o problema. A resposta natural de qualquer outra pessoa (inclusive a minha) foi dizer "não, já tentamos com tudo que era possível. Hoje não vai dá". Mas se avaliarmos friamente, existia sim uma outra possibilidade: um helicóptero içar a antena até o topo. Era viável? Não! Mas era uma possibilidade e eu dei a certeza que não teria como. Fiquei pensando nisso durante alguns meses (rs).
Quando falamos de estimativa isso fica ainda mais evidente. Você já deve ter percebido que, sempre quando enviamos uma estimativa de alguma coisa, as pessoas geralmente se apegam ao que está estimado como um "esboço de certeza". Há várias formas de estimarmos o tempo de uma entrega; por parametrização, por média normalizada e até outros métodos pouco usuais, porém, como liderança, é preciso incluirmos nessa equação aquilo que nos impede de chegar ao grau de certeza máximo e isso não tem mais a ver com matemática, mas com comunicação assertiva.
Heisenberg, em seu Princípio da Incerteza, indicava que no mundo subatômico, não podemos medir com precisão a posição (x) e o momentum(p) de uma partícula. Na gestão de entregas isso igualmente pode ser aplicado (guardada as devidas proporções), exatamente pela natureza desse tipo de abordagem. Então, se pudéssemos traduzir em fórmula aquilo que transmitimos e entendemos como certeza, poderíamos pensar da seguinte forma:
Certeza = (In . Nc) + R
onde,
In é a Informação;
Nc é o Nível de Confiança
R é o Risco
Como geralmente transmitimos a nossa ideia:
Q: Em quanto tempo você acha que fica pronto?
R: Acredito que entre 10 e 15 dias, com certeza.
Mas vamos fazer o possível para ser rápido
Como poderíamos transmitir:
Q: Em quanto tempo você acha que fica pronto?
R: Com qual nível de confiança?
Q: O mais breve possível. Qual seria?
R: Em 10 dias, com 50% de confiança, considerando o que sabemos e os riscos atuais
Em 12 dias, com 75% de confiança, considerando os riscos residuais
Em 15 dias, com 95% de confiança, considerando os riscos não-gerenciados
Ex:
In = 15 dias
Nc = 95%
R = riscos não-gerenciados
Portanto fica evidente que a certeza é sempre algo esperado por quem busca a informação, mas é um erro nos comprometermos com 100% de certeza em algo com tantas variáveis. É obvio que, como liderança, você nem sempre vai poder transmitir a informação expondo todas as variáveis e isso tem uma certa lógica por trás: Para muitos gestores a liderança é quem deve dar as respostas e quem tem a accountability de algo não pode simplesmente responder à questões estratégicas considerando variáveis como Nível de Confiança, por exemplo. Mas isso deve ser uma escolha de quem busca a informação. Quem fornece deve sempre ter em mente que as variáveis não podem ser ignoradas e sem elas não há assertividade.
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